terça-feira, 7 de agosto de 2012

Entrevista

Segue abaixo entrevista realizada por este blog  com Alicia Klein, autora de "A Máquina - O melhor de todos os tempos", biografia brasileira de Michael Schumacher. O material está disponível aqui. as perguntas do F1Critics estão em vermelho.

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Olá, Alicia.

Em primeiro lugar, quero te dar os parabéns por ter publicado o livro sobre Schumacher e, assim, ser a pioneira quando se trata de biografar o grande piloto alemão.

Em princípio, vou te fazer algumas perguntinhas básicas:

- Quando você começou a acompanhar Fórmula 1?

Acho que, como muitos outros aficionados pela Fórmula 1, a paixão foi herança de família. Passei a assistir a corridas com meu pai quando tinha 8 anos de idade. Era um ritual nosso, parte intrínseca do final de semana de GP. Fiquei logo fascinada pela velocidade e pela adrenalina do esporte, como cada piloto levava o carro ao limite, desafiando as leis da física. O fascínio nunca mais passou. 

- Como você desenvolveu interesse especial por Schumacher (você tinha oito anos quando ele começou a correr, certo?)?

 Exato, foi também a época em que comecei a assistir Fórmula 1. Sou de uma geração que mal viu o Senna ser campeão, então aquele alemão novo, meio esquisito, que apareceu do nada numa corrida em Spa, no meio da temporada, logo chamou nossa atenção (minha e do meu pai). Muito rápido, sem dar a menor pelota pro establishment e o glamour da F1, mas dando trabalho para Piquet, Senna, Prost, Mansell...pô, não dava para não se interessar pelo cara. Aí comecei a ler sobre o Schumacher e conhecer mais sobre a obsessão dele pelos treinos, pela parte física, por aperfeiçoar cada aspecto de um talento já inegável e virei fã.

- Você já chegou a entrevistá-lo pessoalmente?

 Infelizmente não tive a oportunidade. Na época em que escrevia o livro, a fila de espera para um entrevista individual com ele era de dois anos, então me custou muito, mas precisei seguir. Mas a verdade é que, ao contrário de gente como Romário e Piquet, não se descobre muita coisa divertida falando com o Schumacher -- sempre mais contido (para não dizer chatinho) nas entrevistas. Aparece muito mais informação valiosa conversando, formal e informalmente, com aqueles que o cercam, que viveram sempre muito perto dele. 

- Li que o livro foi iniciado em seu projeto de conclusão de curso, é isso?... mas como você chegou à decisão de publicá-lo?

É isso mesmo. O trabalho de conclusão de curso representa cerca de 50-60% do que virou a versão final do livro. Logo depois de me formar, tive a oportunidade de enviar os primeiros quatro capítulos do que à época ainda era o TCC para a Editora Record, que se interessou e me ofereceu um contrato para publica o material. Como isso era final de 2005 e havia a expectativa de o Schumacher se aposentar em 2006, resolvemos esperar para ter toda a sua carreira contada no livro. Passei então os dois anos seguintes, reunindo mais informações, fazendo outras entrevistas e trabalhando no texto.

- Schumacher retornou ao pódio no último fim-de-semana, você acompanhou a corrida? Ele é o piloto mais velho desde Jack Brabham (em 1970) a atingir tal feito...

 Acompanhei, claro! Foi uma emoção grande, quase uma viagem no tempo vê-lo voltar ao lugar ocupado outras 154 vezes, de 1992 a 2006. E é engraçado como parece que tudo que o Schumacher faz vem acompanhado de um recorde: maior número de vitórias, maior número de vitórias seguidas, maior número de pódios consecutivos, maior número de hat tricks, maior número de títulos mundiais, maior número de títulos consecutivos, campeonato vencido com maior antecedência, título com a maior margem para o segundo colocado, temporadas consecutivas com vitória e, agora, o piloto mais velho na era moderna a chegar entre os três primeiros. Um fenômeno, em qualquer idade.

- Como seu livro termina a história de Schumacher em 2006, as corridas desde 2010 não são citadas. Pensa em fazer uma edição contabilizando essas temporadas?

Tenho vontade de fazer uma 3a edição (o livro está na 2a), revista e atualizada. Está nos planos, com certeza!

Bem, comecemos pelo final. Particularmente, gosto muito de comparações entre esportes. Por isso, independente de qualquer coisa, achei legal você traçar paralelos... É muito comum ouvirmos coisas do tipo “Fulano é o Pelé do vôlei, do MMA, etc”.
No capítulo “Simplesmente o Melhor” você afirma categoricamente que em outras modalidades esportivas “não há caso de atleta que, imbatível nos números,...”. Federer de fato superou Sampras conforme você mesmo previra em seu texto. Mas fiquei particularmente curioso quanto às suas menções a Muhammad Ali e Jordan: Rocky Marciano realizou 49 lutas e teve o seguinte cartel: 49 vitórias e NENHUMA derrota, além de seis defesas de cinturão. Ali ganhou 56 e perdeu 5, e defendeu o cinturão 3 vezes.
Mas o caso de Jordan é mais notório. Você cita em seu livro que Jordan tem os “6 títulos da NBA, 10 vezes cestinha e a medalha de ouro em Atlanta, 1996”, etc.
Como dito, não sei se esse número passou pela correção quando da segunda edição, mas Michael Jordan não tem uma e sim duas medalhas de ouro, e elas na verdade vieram em 1984 e 1992. Jordan de fato tem 6 títulos da NBA, mas não é o primeiro nem o segundo ou terceiro nesse aspecto: Bill Russel levou 11 anéis; John Havlicek levou 8; Robert Horry (?) possui 7.
Além disso, Kareem Abdul-Jabbar, que conquistou os mesmos 6 troféus de campeão que Jordan, é o recordista nos principais quesitos da NBA: é o maior pontuador (Jordan, o 3°), é o que mais vezes foi selecionado para o All-Star Game (5 jogos a mais que Jordan, o 4° da lista) e é também o que mais vezes foi escolhido melhor jogador da temporada (MVP): 6 vezes (Jordan é o segundo, empatado com Bill Russel, com 5). Jabbar ainda supera Jordan em Assistências, Rebotes e Bloqueios.
Há ainda Wilt Chamberlein, que possui os principais números de pontos e rebotes em um só jogo, numa mesma temporada e na média. Isso sem contar que Kobe Bryant e Lebron James têm quebrado marcas de Jordan e podem vir a superar outras tantas.
Tudo isso exposto, pergunto: Com sua exposição sobre os números de Schumacher em oposição a outros pilotos, não seria mais justo compará-lo com Kareem Abdul-Jabbar? Ou a sua definição sobre Michael Schumacher ser o Jordan da F-1 é por você considerar o jogador americano o melhor em sua área?
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Estas questões sempre virão carregadas de um pouco de subjetividade, de opinião pessoal e são, sem dúvida, mutáveis. Sampras era (quase) inquestionável, até que apareceu Federer. Jordan era (quase) inquestionável, até que apareceu Kobe. Mas ainda assim é difícil achar quem defenda que Jordan já deixou de ser o maior. Jordan, como Ali e Pelé, transcendeu o esporte, seu nome cruzou o mundo, virou quase um embaixador do esporte. Kareem foi um dos maiores, mas não teve esta força e esta representatividade. Mas é possível dizer que ele foi o maior em estatísticas também. Para quem gosta de basquete, vale gastar um tempinho aqui: http://www.hoopsvibe.com/features/flagrant-foul/167293-michael-jordan-kareem-abdul-jabbar-and-wilt-who-is-the-greatest.
Quanto ao Federer, hoje diz-se que é o maior justamente porque superou Sampras em algumas das principais estastíticas. Subjetividade conta, mas no final sempre acredito mais nos números.
Comparo Schumacher a Jordan, Ali e Pelé por serem todos, na minha opinião, os melhores de suas modalidades. No mundo das estatísticas e fora dele.
Concordo com Ross Brawn: “Michael é o melhor piloto do mundo porque aborda sua profissão de forma global. Ser um grande piloto não resulta apenas de ser rápido na pista. Ele é intelectual e fisicamente o mais evoluído. Antes de entrar no cockpit, ou depois de sair, continua sendo o melhor”.


Achei interessante você mencionar a opinião de jornalistas brasileiros, porque teoricamente todos seriam pró-Senna ou Piquet.

Bem, na última corrida, em que Schumacher voltou ao pódio, Reginaldo Leme afirmou categoricamente que Fernando Alonso é um piloto melhor do que o alemão. Tal definição também veio por parte de Marc Gené e Pedro de la Rosa, e Stefano Domenicalli e Lucca di Montezemolo chegaram a dizer que “Alonso é do nível de Schumacher” e que “em certos aspectos é até melhor”.
O que você pensa sobre isso? É possível comparar o espanhol ao alemão? E poderá ele fazer pela Ferrari algo como o que Schumacher fez? Se não, o que falta(ria) para isso acontecer? Em que pese a seca de títulos, em 96 a Ferrari estava melhor do que aquela de 2009, quando Fernando Alonso chegou...
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Alonso chegou a uma Ferrari renascida – renascida, em grande parte, pelas mãos de Schumacher, Jean Todt e Luca di Montezemolo. Schumacher chegou a uma Ferrari que era motivo de piada, um defunto insepulto, como chamei no livro. Outros, não quiseram nem se arriscar (Senna) e outros, que tentaram, desistiram rapidamente (Prost).
Não acho que seja possível comparar um piloto que tem dois títulos mundiais com um que tem cinco. Seria o mesmo que comparar a Seleção Brasileira de futebol com a do Uruguai. Ok, exagero. Mas seria como como fazer esta comparação com a Argentina.
O Alonso pode ser melhor em alguns aspectos, mas não acho que seja tão completo quanto o Schumacher, nem capaz de ajustar uma equipe como fez o alemão. E vale lembrar que o espanhol não ganha um título desde 2006. Mas acho que este ano ele leva!


Já que citamos Alonso e a equipe italiana, falemos com relação à “ressurreição da Ferrari”.

No livro de Gerhard Berger, “Na Reta de Chegada”, há um capítulo intitulado “Ferrari II”, Berger conta tudo o que aconteceu na equipe entre 1993 e 1995. Berger relata a chegada de Jean Todt da seguinte maneira: “Todt tinha um ceticismo muito saudável em relação a tudo o que acontecia na Ferrari e passou a se dedicar com afinco a compreender a equipe. (...) Hoje eu sei que, apesar de a ressurreição da Ferrari ter demorado muito mais que se pudesse prever, ela certamente começou no dia em que Jean Todt chegou”. (página 109).
Sobre a contratação de Schumy, ele fala: “Montezemolo e Todt me disseram [início de 1995]: ‘Precisamos fazer pelo menos uma consulta pro forma a Schumacher, pois, além de jovem, ele é campeão mundial e pode até ser campeão de novo. Ele é super rápido, a Alemanha se tornou o mercado mais importante para a Ferrari, a Fiat está lançando o Bravo, tudo se junta”
Isso posto, cito a página 221 de seu livro, onde você diz que “foi mesmo a firmeza de Schumacher nas pistas, e sua destreza nos boxes e nos bastidores” que salvariam a Ferrari. Na página anterior você também fala que quando Schumacher chegou lá “a equipe estava em pandarecos”. Como você mesmo cita em determinada passagem, a Ferrari conseguiu somente duas vitórias entre 1991 e 1995. Mas será que o time estava mesmo tão ruim?
Tanto em 1992 quanto em 1993 foram menos de 30 pontos e apenas dois pódios. Já em 1994, com Todt à frente, foram 71 pontos e 11 pódios (1 vitória) e em 1995 foram 73 e também 11 pódios (com outra vitória) Com Schumy, em 1996, a Ferrari venceu 3 corridas e terminou com 70 pontos e 9 pódios.
É fato que Schumacher é melhor que Berger e Alesi juntos, e com uma mão quebrada, mas não seria ele uma espécie de “cereja no bolo” em toda aquela estrutura que vinha em franca evolução desde 1993? Ainda mais se considerarmos os oriundos da Benetton que chegaram em 1997, e o salto definitivo... Afinal, Brawn conquistou um título em 2009, com Jenson Button, e a Ferrari teve Todt em 2007, quando levou com Raikkonen...
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 De fato o Schumacher não reconstruiu a Ferrari sozinho, isso seria impossível. O trabalho já vinha sendo feito por Montezemolo e Todt, os grandes maestros da coisa toda. Mas é fato, e algumas das entrevistas do livro mostram isso, que algumas das peças fundamentais desta engrenagem só toparam o desafio (ou permaneceram a bordo quando a coisa apertou) por causa do Schumi – caso do próprio Brawn e também de Rory Byrne.
Como disse Montezemolo, justificando a contratação de Schumacher por estratosféricos 50 milhões de dólares por dois anos de contrato:
“Eu preciso de um grandíssimo piloto. Preciso de sua inteligência, preciso que ele incentive e melhore a equipe, preciso de alguém que vá tentar vencer não só uma corrida, mas a próxima e a próxima até que tenhamos restaurado o mito Ferrari. Para sermos a melhor, precisamos do melhor piloto”.


Gostaria de saber quanto ao projeto de pesquisa sobre os GPs... Bem, em alguns casos, algumas informações relevantes ficaram ausentes. Quando fala de 1999, por exemplo, você não cita o episódio da “roda fantasma” de Irvine. Também notei que você não fala do acidente de Schumacher com Frentzen no Canadá, 1998... Porém, o que me intrigou foi sua descrição do GP da Argentina de 1998. Na página 164 você diz: “No domingo, Michael largou mal, caiu para terceiro, mas recuperou rapidamente a posição; logo no quarto giro, atacou Coulthard e tomou-lhe a ponta em uma manobra espetacular”. Bem, a manobra é bastante controversa, e indica na verdade que Schumacher foi imprudente. Coulthard acaba ficando na contramão, tamanha a força do impacto... Como foi feito o projeto de pesquisa com relação às corridas descritas no livro? Você assistiu vídeo de todas elas, leu resumos em sites especializados?

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Não entendi a pergunta.


Outra passagem em seu livro que me chamou bastante atenção foi quando (na página 222) você fala que “sua presença tornou-se tão dominante que, pela primeira vez na história da categoria, mudaram-se as regras para que a diferença entre Schumacher e os demais pilotos fosse reduzida – antes dele, regulamentos haviam sido adaptados apenas a fim de equilibrar a disparidade entre equipes, jamais indivíduos”.
Excluindo-se mudanças de ordem técnica (como as de 1989—fim dos turbos—, 1994—fim da eletrônica—, 2008 ou mesmo agora)
Em 1958, encurtaram bastante a distância dos GPs, além da questão nos abastecimentos, e isso acabou prejudicando Fangio, que vencera os últimos 4 campeonatos, consecutivamente;  Em 1961, alteraram as regras de motores – com o limite de 1500 cilindradas – e modificaram, também, o sistema de pontos. Como resultado, Jack Brabham (então bicampeão) tornou-se um mero coadjuvante; Na época mais recente, de 1990 para 1991 tivemos mudanças bastante importantes: primeiro a abolição dos descartes e o aumento de 1 ponto na vitória, e a modificação no sistema de treinos (entre 1988 e 1990, Senna foi o piloto que mais venceu e fizera 36 poles em 48 GPs), que antigamente era dividido entre a sexta e o sábado; Com Schumacher, tivemos as grandes mudanças de 2003 (treinos e pontos) e 2005 (proibição da troca de pneus).
Como podemos afirmar que somente no caso de Schumacher a mudança foi motivada pelo piloto?
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Fangio pode ter sido prejudicado, mas pode-se dizer que as mudanças foram feitas por causa dele? Havia, por exemplo, o argumento de melhorar a segurança dos pilotos no encurtamento dos GPs. O fato de a mudança de regras afetar um outro piloto especificamente não quer dizer que ele foi o causador da mudança. Brabham deixou de ser dominante também por outras razões.
Concordo que a mudança no sistema de treinos pode ter sido motivada em parte pelo domínio absurdo de Senna na conquista de poles, mas havia uma questão comercial e de interesse de TV para mudar o treino, concentrando a parte classificatória em apenas um dia.
Ninguém na FIA jamais admitirá mudanças sendo feitas para controlar a hegemonia de um só piloto ou equipe, mas na minha opinião a de Schumacher é a mais marcante – e a mais “identificável” em declarações de cartolas importantes da época.


Pegando um gancho com a mudança de 2005, farei agora uma pergunta um pouco mais técnica e que não tem, necessariamente, relação com algum texto do livro: a proibição das trocas de pneus naquele ano afetou Schumacher diretamente (basta ver os resultados, ele só não passando “em branco” por conta do GP dos EUA), pois sempre vimos que ele foi um mestre em fazer voltas rápidas antes de entrar nos boxes. Desde seu retorno, em 2010, a FIA aboliu o reabastecimento, que começou a acontecer em 1994, quando – fatores técnicos a parte – Schumacher deu um grande salto de competitividade.
Não seria esse o calcanhar de Aquiles de Schumacher? Muito se fala em idade, em mudanças nos carros entre 2007 e 2010, mas não seriam a ausência do reabastecimento e os usos diferentes de pneus que realmente têm prejudicado o desempenho de Schumy nesse retorno? Como você avalia o desempenho do alemão em sua volta? Alguns especialistas, como Reginaldo Leme e Lito Cavalcanti, consideram que isso o “diminuiu” na história. Você concorda?
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O fator estratégia pesou muito no desempenho de Schumacher ao longo dos anos, isso é inegável – graças à brilhante parceria com Ross Brawn, diga-se. Houve corrida em que, de acordo com uma estratégia de Brawn de três paradas, Schumi precisava abrir 25 segundos em 19 voltas. Ele foi lá e fez. Isso requer muita precisão e foco. Então, claro, você tira o reabastecimento e muda o uso dos pneus, o piloto precisa se adaptar. Mas acho que a falta de resultados neste retorno deva-se a mais do que isso: ele não está sentado num grande carro e ele tem 43 anos! Seria ilusão pensar que ele voltaria disputando títulos, ainda mais contra uma geração com pilotos do nível de Alonso, Hamilton e Vettel.
Não sei se isso o “diminui” na história. Talvez para os fãs mais novos, que terão a memória de um Schumacher “de 7o lugar”, em vez da do grande vencedor que ele foi até meados dos anos 2000. E, claro, prejudica as estatísticas, principalmente no quesito porcentagem e aproveitamento por corridas disputadas. Mas acredito que, com o tempo, melhor amigo dos ídolos do esporte, valerão mesmo seus sete títulos mundiais, seu domínio avassalador e a participação na ressurreição do mito Ferrari.


Falando sobre a volta, em 2010, houve aquele episódio de Schumacher com Barrichello na Hungria. Como você vê aquilo? lembro que no livro você chega a mencionar que “talvez” a antipatia de muitos para com Schumacher se devesse a manobras estranhas no começo da carreira do alemão...
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Acho que ficou um ranço, um resquício negativo pelo lado do Barrichello no relacionamento com o Schumacher. Não deve ser fácil viver à sombra do companheiro de equipe, mesmo sabendo que o colega é um dos maiores nomes da história do esporte. O que aconteceu na Hungria, em 2010, é muito fruto disso, imagino. Mas também da competitividade natural que um piloto de Fórmula 1 precisa ter.


E já que eu falei em Barrichello, não há como não mencioná-lo analisando a carreira de Schumacher. Não há a menor dúvida de que Schumacher foi um piloto melhor e mais rápido, e isso já é o suficiente para que ele vencesse os campeonatos que venceu.
Da mesma forma, como você fala na página 236, “Dizer que um era privilegiado com melhor equipamento é das maiores bobagens que se poderia sugerir. Tamanhas são as somas de dinheiro que ninguém ousaria a dar a um dos pilotos tecnologia inferior somente para prejudica-lo”. Porém, há alguns episódios que realmente vão muito além de teorias da conspiração, etc.
Um deles particularmente desafia a lógica de que a equipe Ferrari apenas errasse. Me refiro ao GP da França de 2002, à largada... Tal episódio, a meu ver, não tem explicação. É muito insano pensar que os mecânicos estavam ali até o início da volta de apresentação e que, mesmo ao lado do carro, retiram apenas o cavalete traseiro, e não o da frente do carro. Você se lembra desse fato?
http://www.youtube.com/watch?v=TPNEE1pMcbg&feature=player_detailpage#t=260s
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Lamentável que algo assim aconteça neste nível do automobilismo e com uma equipe como a Ferrari, mas não acho que isso tenha ocorrido de propósito. Como disse, é muito dinheiro envolvido para uma equipe se expor ao ridículo desta forma. E, se fosse para prejudicá-lo deliberadamente, fica a pergunta: por quê? Problemas de relacionamento do Barrichello com sua equipe de mecânicos? Não sei, mas não vejo como este tipo de problema tenha provocado qualquer impacto nos resultados do Schumacher. Alguém se arriscaria a dizer que se a equipe amasse o Barrichello e jamais tivesse cometido um erro com ele, o Schumacher não teria sido o que foi?


Li no site Tazio (http://tazio.uol.com.br/blog/blog-redacao/schumacher-esta-perto-de-igualar-recorde-de-abandonos-para-uma-temporada/) que Schumacher está prestes a igualar, em 2012, sua pior marca de abandonos numa mesma temporada: esse ano ele já abandonou em 5, contra 7 em 1993 e 2005.
Quando ele abandonou o GP do Japão de 2006 e, consequentemente, a disputa do título daquele ano, ele pôs fim a mais um recorde: o de GPs consecutivos sem qualquer quebra de motor: 6 anos e meio, desde França 2000. Em 2005, no Bahrein, ele já havia estabelecido a maior marca de período completo sem quaisquer falhas mecânicas: a última vez que ele teve problemas tinha sido em 2001.
Nas décadas anteriores, abandonos por problemas de equipamento eram muito mais comuns. Em determinada passagem do livro, você descreve isso como “reflexo do melhor acerto de Schumacher”, etc. Mas isso inegavelmente contribuiu para que ele obtivesse diversos recordes, principalmente aqueles em uma mesma temporada. Havia muito menor restrição orçamentária e testes não eram limitados. Como você analisa tudo isso?
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Se o número de abandonos diminuiu na época do Schumacher, diminuiu para todos, não? Michael apenas tirou mais vantagem deste aspecto.
Acredito muito na capacidade do piloto de trabalhar com os mecânicos no acerto do carro para evitar quebras e problemas técnicos. Claro que isso só não resolve, mas basta ver a comparação de abandonos de Schumacher e Barrichello, trabalhando com o mesmo equipamento. O primeiro piloto vai sempre ter vantagens, receber o apoio dos melhores funcionários, ter preferência em caso de “desempate”, mas a verdade é que a matéria-prima é a mesma.


Um outro ponto que me chamou bastante atenção foi sobre a temporada de 1994. Falo especialmente sobre quando você menciona o GP da Inglaterra daquele ano, argumentando em favor de Schumy e contra a punição por ele sofrida (bandeira preta + suspensão), dizendo que nunca houve caso em que “tais punições ocorressem”.
No entanto, uma pesquisa rápida nos mostra que as mesmas sanções já haviam, sim, sido aplicadas: quanto à punição sobre a ultrapassagem durante a volta de apresentação, John Watson fora desclassificado diretamente no GP da África do Sul de 1983, e o desrespeito à bandeira preta gerou uma suspensão a Nigel Mansell após o GP de Portugal de 1989 – na página 90 você fala que “apenas uma multa foi aplicada ao leão”.
Além disso, temos o GP da Alemanha daquele ano, quando foi descoberta a fraude no reabastecimento... E sobre o controle de tração há evidências suficientes que comprovam que o B194 contava com o componente, inclusive a FIA anunciou isso no fim-de-semana do GP da Alemanha (teriam encontrado o artefato ao analisar a “caixa preta” do carro em San Marino). Na internet circula uma imagem da largada do GP da França, que reforça a ideia...
De certo modo, a temporada de 1994 tem se tornado uma espécie de “prova” para muitos de que Senna vinha sendo superado por Schumacher indiscutivelmente. Muitas pessoas, inclusive, usam o termo “Senna morreu tentando superar o Schumacher”. No seu livro, inclusive, você menciona uma frase de Irvine que vai de encontro a isso, quando ele diz que “senna seria forçado a se aposentar”. De que maneira a existência de tais componentes ilegais teria camuflado o desempenho de Schumacher no comparativo a Senna? E de que forma você “lê” a temporada de 1994 e o combate dos dois ao longo daqueles 3 GPs?
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Senna morreu na terceira corrida do ano, então é difícil fazer grandes avaliações sobre o carro, mas era notável o “desespero” do brasileiro ao ver que o FW16 não tinha o desempenho esperado. Vale lembrar que correr pela Williams era o grande sonho de Senna e é razoável imaginar que ele esperava encontrar o carro dominante que a equipe de Frank havia alinhado nos grids dos primeiros anos da década de 1990. Com ou sem componentes ilegais no B194 (o que, embora tudo indique que houvesse, nunca foi provado), o bólido da Williams era, até aquele momento, um desastre.
Além disso, Senna estava na descendente e Schumacher, na ascendente. Um piloto com 34 anos e o outro, com 25. Uma analogia possível seria Schumacher versus Alonson em 2005 ou 2006. Não acho que o desfecho da temporada teria sido muito diferente caso Senna tivesse sobrevivido à Tamburello.


Com relação a pesquisas, entrevistas, etc, de fato são coisas muito subjetivas. Você diz em seu livro que Senna e Fangio superam Schumacher porque ambos já morreram, se aposentaram havia tempos, enfim. É fato, também, que acontecem muitos exageros da parte de fãs brasileiros. Inclusive, há um e-mail que circula até hoje, pedindo para que se vote em Senna no site “corrieredellosport”... Mas passaram-se três anos entre a primeira aposentadoria de Schumacher e seu retorno e, nesse meio tempo, aconteceram duas pesquisas que chamaram muita atenção.
A primeira delas por ter sido promovida no site alemão motorsport-total.com: a pesquisa sobre o melhor piloto foi feita no fim de março de 2010 (logo do retorno de Schumy) e teve o seguinte resultado: 25 mil votos, 45,19% apontando Senna em 1° e 39,16% apontando Schumacher.
Mas sem dúvida a votação mais expressiva foi aquela de AutoSport, ao fim de 2009 (o resultado saiu 12 dias antes de Schumacher anunciar o retorno oficial à F1), quando 217 pilotos, desde José Froilán Gonzales (contemporâneo de Fangio) até Jaime Alguersuari (o mais jovem piloto a disputar um GP), passando por Alan Jones, Michael Schumacher e Jenson Button, tiveram de fazer uma lista de 10 melhores. Schumacher ficou em 2°, atrás de Senna.
Qual foi a sua avaliação sobre esta(s) enquete(s)?
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Vou recorrer a uma das citações do livro para responder a esta pergunta. Do meu querido colega Fábio Seixas, quando perguntado por que Senna e Fangio costumam figurar à frente de Schumacher em pesquisas de opinião: “Porque estão mortos, simples assim”.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Dia Internacional da Mulher

Em homenagem ao dia das Mulheres, um texto de Luís Fernando Ramos contando a história que "Elas" fizeram na Fórmula 1.
Elas

Em meio à ressaca da etapa de abertura da Fórmula 1, esta notícia passou quase desapercebida na última semana: a Jaguar propôs à irlandesa Sarah Kavanagh um trabalho como piloto de testes. Seria um programa a longo prazo, com Sarahcorrendo neste ano na F-3, em 2005 na F-3000 e, finalmente, testando o Fórmula 1 da equipe em 2006. Meio caminho andado para, um ou dois anos depois, estrear na categoria como titular.

Seria uma boa oportunidade de voltarmos a ver uma mulher pilotando na F-1, não fosse por dois detalhes. Primeiro: a irlandesa estaria com 33 anos em 2007, uma idade muito avançada para uma estreante. Segundo: a proposta da Jaguar exige que a piloto traga para a equipe um milhão de euros. Dá para ver claramente que a intenção da equipe não é exatamente de levar alguém do sexo feminino para a categoria máxima do automobilismo mundial. Trata-se na verdade de um golpe de marketing, ainda por cima faturando algum dinheiro com isso. Safados, estes ingleses.

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É uma pena. Em mais de 50 anos de Fórmula 1, apenas duas mulheres disputaram um Grande Prêmio: as italianas Maria-Teresa de Filippis, em 1958, e Lella Lombardi, em 1975. Para quem gosta de estatísticas, isto representa 0,3% entre todos os pilotos que já correram na categoria. A explicação mais comum para esta participação insignificante é sempre de ordem física: as mulheres são mais frágeis e têm dificuldades para suportar o esforço envolvido na pilotagem de uma máquina tão potente. Uma bobagem tão grande quanto achar que Alex Yoong é melhor do que Michael Schumacher.

Quem prova isto é a pioneira Maria-Teresa. No GP da Bélgica de 1958, a italiana cruzou a linha de chegada em décimo-lugar após completar 310 quilômetros num circuito exigente como Spa-Francorchamps – que tinha o dobro da extensão do traçado atual. Atingiu velocidades acima de 270 km/h com sua Maserati 250F (com pneus finos e sem cinto de segurança) e terminou a prova no mesmo estado de seus companheiros homens. “Nunca tive nenhum problema físico, apesar de ter na época os mesmos 49 quilos que tenho hoje”, comenta a senhora de 77 anos, que ainda participa eventualmente de corridas de carros antigos.

As desculpas mascaram a falta de espaço que as moças disfrutam neste mundinhochauvinista chamado automobilismo. Se no Kart o preconceito já é latente, o que dizer da Fórmula 1, onde recepções calorosas só são reservadas à mulheres com meio litro de silicone nos seios? “Antes da minha estréia na África do Sul, não me deram a chance de fazer um único teste. Nem mesmo um molde de banco eles fizeram”, reclama Giovana Amati, a última a tentar se qualificar para um GP de F-1, em 1992 com a Brabham.

Quando a italiana chegou à categoria. era mais famosa por ter tido um caso com Niki Lauda do que por suas qualidades ao volante (olha o chauvinismo aí de novo). Marcou tempos ridiculamente piores que os do companheiro Eric Van de Poele, mas há quem acreditasse que faltou apoio para Amati. “É uma das mulheres mais malucas que eu conheci. Ele tinha a pegada necessária para se manter no circo, era mentalmente forte. Mas teve de sair da F-1 por motivos financeiros”, opina o ex-piloto e comentarista Christian Danner.

Como Giovanna, outras duas moças também tentaram sem sucesso se classificar para uma corrida. Ou melhor, uma delas até conseguiu, mas não entrou para a história. Desiré Wilson largou no GP da África do Sul de 1981 em 15° lugar, três posições apenas atrás do companheiro na Tyrrell Eddie Cheever e ao lado da McLaren de John Watson. Abandonou a prova após 51 voltas, mas a corrida acabou sendo desconsiderada do Mundial devido à briga entre a FISA (de Jean-Marie Balestre) e a FOCA (de Bernie Ecclestone – use a ferramenta de busca do GPtotal para saber mais).

Um ano antes, Wilson venceu uma corrida da série Aurora em Brands Hatch, batendo pilotos que estabelecidos na F-1 da época, como Eliseo Salazar e Guy Edwards. Para quem não sabe, esta categoria utilizava modelos que tinham acabado de ser descartados pelas equipes da Fórmula 1. O da piloto sul-africana era um Wolf WR3, utilizado por Jody Scheckter em 1978. Ainda em 1980, Desiré ficou em último no qualifying do GP da Inglaterra, mas apenas meio segundo atrás de um certo Keke Rosberg e a um segundo do então campeão mundial Scheckter.

Quem completa a lista feminina é Divina Galica, uma inglesa que veio do esqui e tentou três classificações nos anos 70, sem sucesso. Hoje, vejam só, ela é instrutora de pilotagem na Skip Barber Racing School, uma das mais conceituadas do mundo.

Os pontos em comum na história destas cinco mulheres na Fórmula 1 são a falta de equipamento competitivo e a chance restrita que tiveram para mostrar suas credenciais. A única a marcar pontos foi Lella Lombardi, com um sexto lugar no confuso GP da Espanha de 1975. A prova foi interrompida no meio após um acidente com o piloto Rolf Stommelen que matou cinco pessoas. A italiana levou meio ponto para casa em sua segunda e última corrida na categoria. “Lella sempre ganhava o pior motor, o pior jogo de pneus. Ela era tecnicamente boa, entendia de mecânica, mas a March simplesmente a destratava”, relembra seu companheiro de equipe Hans Stuck.

Já é hora da Fórmula 1 rever seus conceitos. No início dos anos 80, a Audi deu um carro de fábrica para a francesa Michèle Mouton disputar o Mundial de Rali. Ela venceu quatro etapas e foi vice-campeã mundial em 82. Outro exemplo é o da alemã Jutta Kleinschmidt, campeã do Dakar em 2001, quando contou com apoio total da Mitsubishi. Um exemplo de que apostar no profissionalismo pode dar resultados, sem estas bobagens de “sexo frágil”.

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Mudando de assunto, mas mantendo a indignação: desde que comprou os direitos de transmissão para o Brasil, a Globo (via Globosat) vem tentando empurrar a Nascar goela abaixo dos fãs de automobilismo. Me desculpe quem goste, mas temos aqui o maior engodo do automobilismo mundial. As corridas são absolutamente artificiais (zilhões de bandeiras amarelas, 600 quilômetros de corrida sendo que só os últimos 100 valem alguma coisa) e a categoria é cheia de enganadores.

Vejam só que incrível história para ilustrar isto: há algumas semanas, na Carolina do Norte, apenas 37 pilotos estavam inscritos para um grid de 43 carros. Isto abriu espaço para o retorno de Joe Ruttmann, um vovô de 60 anos de idade que disputara sua última corrida na Nascar em 1995. Ele fez apenas a volta de classificação (ficou em último entre os que marcaram tempo) e passou os treinos livres basicamente sentado nos boxes, porque não dispunha de uma equipe de mecânicos. Exatamente por isto recebeu a bandeira preta de desclassificação logo na primeira volta da corrida. Vocês acham que ele se importou? Que nada! Pegou o cheque de 54.196 dólares do último lugar e foi prá casa feliz da vida. Depois falam que não existem dinheiro fácil...

Luis Fernando Ramos

domingo, 14 de agosto de 2011

1994 x 2006 - parte 2

E agora a segunda parte deste breve especial, comparando duas das mais históricas temporadas da Fórmula 1.

domingo, 7 de agosto de 2011

1994 X 2006 - parte 1

Está no ar o texto que fala sobre a temporada de 1994 comparando-a a de 2006. Semana que vem a segunda parte.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Datas especiais

Dia 19 de Abril, por exemplo, é o aniversário do rei da música brasileira, Roberto Carlos, e de um dos maiores poetas brazucas, Manuel Bandeira. O dia 8 de dezembro é a data de falecimento do maior compositor da música brasileira, Tom Jobim, e de um dos maiores nomes do mundo pop, John Lennon.

E o dia 24 de junho também é especialíssimo: aniversário de Lionel Andrés Messi e Juan Manuel Fangio.


Um é o maior nome do futebol na atualidade e caminha para inscrever-se como um dos maiores de todos os tempos. O outro foi sem dúvida um dos melhores, se não o melhor a história da Fórmula 1. Na opinião do F1Critics, Fangio divide com Senna essa posição.